Um papo muito sério


“...brigou com a namorada, mais uma vez bêbado, tentando afagar a tristeza que sentia por dentro, não sabia dizer de onde o vazio vinha, mais uma vez estava desafiando a morte em uma estrada de alta velocidade, aos gritos da namorada, saiu do carro e irrompeu pela rua, os carros passavam ruidosamente e parecia que uma tragédia estava desenhada...”

“...passava noites e noites na internet. Se achava alguém especial, poucos sabiam quantos dias já estava preso sem sair daquele quarto, na internet, parece que um outro mundo o chamava e os tais remédios que diziam ajudar, ah pra que essa merda serve? As pessoas dentro de casa comentavam mas ninguém fazia nada para intervir. Poderia colocar seus planos em prática, eles não iriam lhe atrapalhar...”

“...todos haviam lhe abandonado. Há muito tempo não limpava a casa. Há quantos dias não tomava banho? Ah...isso não importa. Tinha o que precisava, um computador, a internet, nem chegou a ligar para aquelas dores no peito que sentia, ele não iria ser mais um daqueles afeminados que caía diante dos problemas...mas as dores...elas estavam ficando mais fortes...”

Boa noite. As três histórias são reais.
Eu somente retirei delas o sujeito e os nomes, mas todas realmente aconteceram, e nenhuma delas teve um final feliz.
O inimigo em todas elas é algo invisível. Algo que as pessoas pronunciam mas tem receio de lidar. A depressão.
                Hoje eu resolvi abrir a minha caixa de ferramentas em relação a esse tema. Não me considero especial, mas não minto me considero hoje um ser humano melhor por ter aprendido a lidar melhor com isso. Escapei de todas essas armadilhas, mas reconheço que não saí sem algumas sequelas.
                O meu problema começou antes do nascimento da minha filha, na verdade começou da pior maneira possível. Tive uma crise psíquica que culminou em um verdadeiro terremoto na minha vida pessoal e acabou levando meu casamento pro ralo. Foram sucessivas tentativas de recuperar o controle, todas sem sucesso.
                Daí eu tomei aquela atitude sensacional de que bastava me afastar das pessoas que eu amava (que também estavam em crise) e os problemas se curariam magicamente! Não sei onde eu estava com a cabeça quando pensei isso. Lógico, a coisa fez foi piorar...e muito.
                E aí começaram os problemas. De relacionamento, lógico. Misture isso com filhos, desemprego e aí você tem a receita pronta do bolo do inferno. De mal a coisa ficou pior e isso claro, foi começando a atingir minhas relações. Entrei numa espiral que por muito pouco não me levou a minha vida pro mais fundo buraco.
                Porém um belo dia e cansado de levar tanto portão na cara e andar sem nenhum objetivo aparente. Tomei vergonha na cara e resolvi procurar ajuda médica, reconheci minhas falhas diante das pessoas, me tornei uma pessoa mais vulnerável, o que me levou a quase reatar algumas amizades com algumas pessoas que tinham se tornado desafetos, tudo isso enfrentando sol a sol a maior das tempestades que passei na minha vida.
                Tomo remédios há mais ou menos três meses. Tenho um problema grave de ansiedade e o remédio me devolveu minha paz, não vou mentir que ainda tenho muitos problemas, principalmente com amigos antigos, que não entendem o quanto mudei e daí sempre vem pessoas dizendo coisas como: “ele é uma sombra do que já foi”. Sabe onde eu tinha lido isso? Em um HQ do Wolverine.
                Logan. O Wolverine. Legal. Mas eu não sou um canadense desmemoriado com garras de adamantium (eu até queria ser). Sou apenas uma pessoa que passou por um trauma pesado e que mudou por isso. Ainda estou mudando. Mais ou menos como o personagem da música “Meio Psicopata” do Matanza. Evito contatos e ainda estou re-aprendendo a me relacionar com as pessoas. Isso mudou meu estilo de música, minha maneira de enxergar as pessoas, ou seja, tudo.
                Com essa nova visão de mundo, me tornei uma pessoa mais atenta e bem mais generosa a visão das pessoas. Meio lugar comum isso mas recuperei minha paz de espírito, posso ouvir de um trap music a um metal mais pesado e fazer minha própria festa, escrever para mim se tornou uma terapia, devido aos remédios, deixei um pouco a bebida (minha companheira de anos), isso somado a minhas aparições repentinas, voltei o foco em mim, tudo isso com mais autocontrole, pra muita gente pode ser pouco ou nada mas pra mim isso fez toda a diferença. Ter controle sobre minhas ações e minha própria vibe. Dentro do meu ideal de independência que eu preferi seguir.

                Infelizmente alguns não conseguiram. Eu sobrevivi para contar algumas das histórias tristes que vocês leram lá em cima. Depressão é coisa séria, tira pouco a pouco, tudo o que você tem. E muitos só se voltam para isso quando é tarde demais.

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